Terno, gravata e sapatos velhos. Este era o uniforme diário
de Arthur, um fumante inveterado, mau-humorado e viciado em cafeína, que passava
seus dias megulhado em uma pilha de papéis embaralhados e bagunçados na sala 20
da repartição pública. Formou-se em direito, para despeito de seu pai, que
sonhava vê-lo engenheiro. As pessoas ainda se perguntam se sua escolha foi por
gosto, ou simplesmente para contrariar. Arthur nunca soube ser simpático,
andava pelos corredores do prédio, onde encontrava diversas pessoas, mas em
quinze anos de profissão, nunca retribuira, sequer um “bom dia”, que
atualmente, só recebia dos recém-chegados, que nunca tiveram nenhum dos
costumeiros encontros desagradáveis com ele, a quem se podia chamar de workaholic. Sim, Arthur traballhava dia
e noite naquela maldita sala, como se fosse sair de lá com a cura do câncer.
Ninguém, jamais ousava cruzar o seu caminho em dia de tribunal, havia um burburinho
na repartição sobre isso. Arthur dividia opiniões no ambiente de trabalho.
Aqueles pobres que já o trombaram em dia de audiência diziam, com uma certeza
assustadora, ter visto a face do demônio, com narinas dilatadas e cenho franzido,
pisando rudemente, com a determinação de quem pretendia destruir o assoalho. A
datilógrafa, que acompanhava todas as audiências, descrevendo cuidadosamente
tudo o que acontecia, costumava chamá-lo de Miguel Arcanjo, pois vira inúmeras
vezes seu desempenho simplesmente magnífico perante o júri, resultado de todas
as malditas horas enfurnado naquela sala mofada. Quantas pessoas Arthur já
ajudara? Ela perdeu as contas há muito tempo. Por que um advogado exímio,
extremamente brilhante, se sujeitava a uma vida medíocre, solitária e com
salário de defensor público? Ela sabia o porquê. Sempre pôde ver o brillho que
surgia em seus olhos, instantaneamente, quando ganhava uma causa perdida para
um pobre coitado, que lutava contra algum general de dez estrelas...
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